No norte do Espírito Santo, entre os municípios de Linhares e Sooretama, estende-se uma das mais estratégicas áreas de preservação da Mata Atlântica: a Reserva Biológica de Sooretama. Criada em 20 de setembro de 1982, pelo Decreto nº 87.588, essa unidade de conservação de proteção integral tem como missão essencial preservar os ecossistemas naturais e manter a biodiversidade em sua forma mais íntegra, sem interferência humana contínua.
Originalmente delimitada com 27.858 hectares, a reserva passou por ajustes cartográficos ao longo do tempo, resultando em sua configuração atual de aproximadamente 24.250 hectares. Ainda assim, permanece como o último grande reduto contínuo de mata de tabuleiro no Espírito Santo, representando um relicário de biodiversidade tropical em meio a um cenário de degradação crescente.
Além da sua importância territorial, Sooretama abriga paisagens de elevada complexidade ecológica, repletas de espécies endêmicas e ameaçadas. Assim, cumpre um papel vital como refúgio para fauna rara e como elo fundamental na conectividade ecológica do norte capixaba. Não apenas resiste às pressões externas, como também se destaca por sua integridade ecológica, tornando-se símbolo de resiliência no bioma atlântico.
Uma joia verde em terras capixabas
A mata de tabuleiro é uma formação típica de terras baixas, marcada por árvores de grande porte, solos profundos e elevada diversidade biológica. Nesse cenário, a Reserva Biológica de Sooretama protege um dos últimos núcleos ainda preservados desse tipo de vegetação no país, especialmente diante do avanço da monocultura, da pecuária extensiva e da urbanização, que ao longo do século XX eliminaram boa parte dessas florestas.
Ademais, o relevo local é predominantemente plano, com clima tropical quente e úmido, e estações bem definidas — um verão chuvoso e um inverno relativamente seco. Consequentemente, essas condições favorecem o desenvolvimento de habitats complexos e criam um ambiente propício à ocorrência de espécies interdependentes e altamente especializadas. Por fim, essa dinâmica climática, aliada à vegetação exuberante, contribui diretamente para o equilíbrio hidrológico da região e para a estabilidade dos ecossistemas adjacentes.
Conectividade e resiliência ecológica
Outro diferencial marcante da reserva é sua inserção em um amplo mosaico ecológico. Juntamente com a vizinha Reserva Natural Vale, forma um bloco florestal contínuo que ultrapassa os 50 mil hectares. Essa interligação entre áreas protegidas favorece a circulação de animais, amplia o alcance da dispersão de sementes e contribui para a estabilidade genética de populações silvestres. Além disso, garante maior resiliência ecológica diante de eventos extremos, como secas prolongadas e mudanças no regime hídrico.
Essa posição estratégica faz da reserva um ponto-chave para projetos de reintrodução de fauna, monitoramento climático e pesquisas em conservação genética. Ao preservar sua cobertura florestal, Sooretama também contribui com a regulação do microclima regional, a proteção do solo e a recarga dos aquíferos subterrâneos que abastecem comunidades locais.
Fauna: um santuário para espécies ameaçadas
A diversidade de animais na Reserva Biológica de Sooretama impressiona. Já foram registradas mais de 310 espécies de aves, 70 mamíferos, além de dezenas de répteis, anfíbios e invertebrados. Esse conjunto forma uma teia ecológica interdependente, onde cada espécie cumpre uma função essencial para o equilíbrio do ecossistema.
Entre os destaques da fauna, merecem atenção especial:
- Muriqui-do-norte (Brachyteles hypoxanthus): maior primata das Américas e criticamente ameaçado, encontra em Sooretama um dos últimos refúgios seguros.
- Phylloscartes roquettei (narceja-de-bico-torto): ave endêmica da Mata Atlântica e uma das mais difíceis de observar na natureza.
- Tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla): espécie icônica com papel essencial no controle de insetos sociais como cupins e formigas.
- Puma (Puma concolor): predador de topo que ajuda a manter o equilíbrio entre herbívoros e o restante da cadeia trófica.
- Jacutinga (Aburria jacutinga): ave frugívora de grande porte, vital na dispersão de sementes da flora nativa.
A presença dessas espécies, muitas das quais estão localmente extintas em outras regiões do Espírito Santo, comprova o papel essencial da reserva como último reduto para a fauna silvestre em perigo.
Flora: uma biblioteca viva da Mata Atlântica
A vegetação da reserva abriga árvores que ultrapassam os 40 metros de altura e alcançam mais de 400 anos de idade, como o jequitibá-rosa, a peroba-amarela e o jatobá. Ademais, estimativas de biomassa apontam que a floresta de Sooretama concentra uma das maiores reservas de carbono arbóreo da Mata Atlântica, o que reforça sua importância ecológica em escala nacional.
Outrossim, espécies ameaçadas como a palmeira-juçara (Euterpe edulis) encontram condições ideais para se desenvolver, sustentando a alimentação de diversas aves e mamíferos. Concomitantemente, o estrato inferior da floresta revela uma rica variedade de orquídeas, bromélias, epífitas e cipós, muitas delas com potencial medicinal ou ornamental ainda pouco estudado.
Em suma, essa composição vegetal atua como um verdadeiro banco genético natural, fundamental tanto para pesquisas científicas quanto para estratégias de restauração ecológica e enfrentamento das mudanças climáticas globais.
Preservação integral – sem visitação pública
Conforme estabelece o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), reservas biológicas possuem um regime de proteção máxima. Assim, em Sooretama, a visitação pública é proibida, exceto em casos de pesquisas científicas autorizadas. Essa medida visa garantir que o ecossistema permaneça livre de interferências humanas constantes, ao contrário de parques que conciliam conservação com turismo.
Dessa forma, a lógica por trás desse modelo é clara: manter a floresta em seu estado mais puro possível, garantindo o refúgio de espécies sensíveis e permitindo que os processos naturais ocorram sem perturbações.
Produção científica de relevância nacional
Desde os anos 1990, a Reserva Biológica de Sooretama tem sido palco de importantes estudos ecológicos e genéticos. Pesquisadores da UFES, UFMG e do Instituto Nacional da Mata Atlântica já realizaram monitoramentos de longo prazo sobre o comportamento dos muriquis, dinâmica florestal, fitossociologia e resiliência de ecossistemas frente à fragmentação.
Projetos de destaque incluem:
- O Monitoramento de Primatas de Alta Sensibilidade, que acompanha populações de muriquis-do-norte com o auxílio de tecnologias de GPS e sensores sonoros.
- Estudos sobre ressurgência hídrica e qualidade de aquíferos, que avaliam a função da reserva na segurança hídrica da região.
Os dados obtidos alimentam programas de conservação integrada, subsidiando políticas públicas e ações conjuntas com outras unidades da Mata Atlântica.
Ameaças e vigilância constante
Apesar de sua proteção legal, Sooretama está cercada por pressões constantes. A expansão da monocultura de eucalipto e cana-de-açúcar, os incêndios florestais provocados ou acidentais, e a proliferação de espécies invasoras são riscos que exigem vigilância contínua.
O isolamento geográfico da reserva, em especial, compromete a conectividade ecológica e aumenta a vulnerabilidade de suas populações animais. Sem corredores florestais bem conservados, espécies com grandes áreas de vida, como os grandes felinos e primatas, podem desaparecer.
Programas de educação ambiental, fiscalização ativa e parcerias com proprietários rurais do entorno são cruciais para evitar a degradação e garantir a integridade da unidade a longo prazo.
Como ajudar a preservar Sooretama
Embora o público em geral não possa visitar a reserva, existem diversas formas de colaborar com sua conservação:
- Apoiar ONGs e projetos voltados à Mata Atlântica.
- Participar de campanhas de reflorestamento ou doações para instituições sérias.
- Denunciar queimadas e desmatamentos ilegais nas áreas do entorno.
- Valorizar e defender as unidades de conservação como patrimônios coletivos da sociedade.
Cada ação, por menor que pareça, contribui para que Sooretama continue a proteger o que resta da floresta de tabuleiro.
Um símbolo de resistência ambiental
A Reserva Biológica de Sooretama é muito mais do que uma área protegida. Ela representa um símbolo da resistência da floresta atlântica no Espírito Santo. Sua existência reafirma que, mesmo em regiões severamente pressionadas, ainda é possível proteger ecossistemas íntegros e viáveis. A reserva conserva o maior remanescente de mata de tabuleiro no estado. Além disso, abriga espécies únicas, como o muriqui-do-norte, e mantém uma floresta primária de altíssimo valor ecológico. Por isso, Sooretama se consolida como uma das reservas mais emblemáticas do Brasil.
Preservá-la não é apenas uma escolha técnica. É também um compromisso ético com as futuras gerações, que merecem herdar um mundo em que a Mata Atlântica continua viva, pulsante e biodiversa.
Resumo com perguntas frequentes
A Reserva Biológica de Sooretama é uma unidade de conservação de proteção integral criada para preservar remanescentes de Mata Atlântica, proteger espécies ameaçadas e manter processos ecológicos naturais no norte do Espírito Santo.
Ela foi criada oficialmente em 20 de setembro de 1982, por meio do Decreto nº 87.588, com o objetivo de garantir a preservação de uma das últimas grandes áreas contínuas de Mata Atlântica no estado.
A reserva está localizada entre os municípios de Sooretama e Linhares, no norte do Espírito Santo, em uma área de grande importância ecológica e estratégica para a conectividade de ecossistemas florestais.
O principal objetivo é assegurar a proteção integral da biodiversidade, incluindo espécies endêmicas e ameaçadas; dessa forma, contribui com pesquisas científicas e ações de educação ambiental voltadas à conservação dos ecossistemas naturais.
Você pode apoiar respeitando as normas ambientais, não entrando em áreas restritas, divulgando a importância da reserva e, além disso, incentivando práticas sustentáveis que ajudam a reduzir pressões sobre o bioma Mata Atlântica.
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- Categoria: Parques Naturais do Espirito Santo