Mais do que dividir terras, a reforma agrária estrutural propõe reconstruir o campo — e com ele, a própria ideia de justiça social.
“A reforma agrária estrutural não é apenas uma política agrícola: é uma medida civilizatória, que resgata a dignidade no campo.” – João Pedro Stédile, economista e membro da coordenação nacional do MST.
O Que é Reforma Agrária Estrutural?
A Reforma Agrária Estrutural, também conhecida como Reforma Agrária Clássica, é uma política pública de redistribuição de terras improdutivas, com o objetivo de democratizar o acesso à terra, promover justiça social e, assim, melhorar as condições de vida no campo. Diferente de reformas superficiais, essa abordagem visa mudar profundamente a estrutura fundiária concentradora, típica de países como o Brasil.
Em outras palavras, é uma estratégia essencial para combater a desigualdade histórica gerada pelo latifúndio, herança direta do período colonial e escravocrata.
De acordo com dados do IBGE (2022), apenas 1% dos proprietários rurais controlam quase 47% das terras agricultáveis do país. Essa desigualdade estrutural alimenta a pobreza rural, o êxodo urbano e a degradação ambiental.
Raízes históricas da desigualdade fundiária no Brasil
- Colonialismo e sesmarias: O modelo de concentração de terras surgiu com a distribuição de sesmarias a poucos proprietários pela coroa portuguesa.
- Abolição sem reparação: Após a abolição da escravatura em 1888, os libertos não receberam acesso à terra, perpetuando assim a sua exclusão social.
- Modernização agrícola excludente: A Revolução Verde nos anos 1960 introduziu a mecanização, marginalizando pequenos agricultores e acelerando o êxodo rural.
- Conflitos no campo: A falta de reforma agrária efetiva tem gerado conflitos violentos por terra em todo o país. De 1985 a 2023, mais de 2.000 trabalhadores rurais foram assassinados em disputas agrárias, segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT).
Como Funciona a Reforma Agrária Estrutural?
A reforma agrária estrutural envolve ações coordenadas de desapropriação, reassentamento, assistência técnica, financiamento agrícola e infraestrutura. Não se trata apenas de entregar terra, mas de garantir meios de produção e cidadania no campo.
Principais Pilares da Reforma Agrária Estrutural:
- Identificação e desapropriação de latifúndios improdutivos
- Redistribuição com base na função social da terra (CF/88, art. 186)
- Assistência técnica e extensão rural
- Crédito agrícola acessível
- Educação do campo e fortalecimento da agricultura familiar
- Planejamento ecológico do uso da terra – com foco em práticas regenerativas e agroecológicas
Impactos Positivos da Reforma Agrária Estrutural
Redução da desigualdade social: Estudos do IPEA mostram que a reforma agrária pode reduzir o índice de Gini rural em até 40%.
Segurança alimentar: Assentamentos da reforma agrária produzem cerca de 70% dos alimentos consumidos no Brasil, de acordo com o IBGE.
Fixação do homem no campo: Ao garantir dignidade e renda, evita o êxodo rural e a urbanização descontrolada.
Regeneração ambiental: Ao aplicar princípios da agroecologia e recuperação de áreas degradadas, os assentamentos podem se tornar territórios de resiliência climática.
Valorização da cultura camponesa: Mantém vivas tradições, saberes ancestrais e modos de vida sustentáveis.
Reforma Agrária Estrutural e Sustentabilidade
A reforma agrária, quando pensada de forma ecológica, contribui diretamente para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), principalmente:
- ODS 1 – Erradicação da pobreza
- ODS 2 – Fome zero e agricultura sustentável
- ODS 10 – Redução das desigualdades
- ODS 12 – Produção e consumo responsáveis
- ODS 13 – Ação contra a mudança global do clima
- ODS 15 – Vida terrestre
Além disso, estudos de caso em assentamentos agroecológicos (ex: Assentamento Normandia, PE) mostram que práticas sustentáveis como a agrofloresta, compostagem, reflorestamento e policulturas restauram solos degradados e aumentam a biodiversidade.
Desafios e Críticas à Reforma Agrária Clássica
Apesar de seus benefícios, a reforma agrária enfrenta diversos entraves, como, por exemplo:
- Falta de vontade política: Governos liberais e conservadores geralmente priorizam o agronegócio.
- Infraestrutura precária nos assentamentos: Muitos não têm acesso à água potável, energia ou escolas.
- Desinformação e criminalização: Movimentos sociais são frequentemente retratados como invasores ou ameaças.
- Pressão do agronegócio: Grupos de poder ligados ao latifúndio atuam politicamente para manipular, bem como manter o status quo.
Mesmo assim, o modelo estrutural permanece como uma das principais ferramentas de justiça climática, social e ambiental no país.
Comentários de Especialistas sobre a reforma agrária estrutural
“A reforma agrária não é uma utopia, é uma necessidade estrutural para transformar o Brasil em uma nação verdadeiramente democrática.” – Darci Frigo, advogado de direitos humanos e coordenador da Terra de Direitos.
“Só a agricultura familiar e agroecológica, fortalecida por uma reforma agrária justa, é capaz de alimentar o mundo sem destruir o planeta.” – Vandana Shiva, física e ecofeminista indiana, referência mundial em soberania alimentar.
Conclusão: Um Novo Futuro é Possível
A Reforma Agrária Estrutural deve ser entendida como um passo essencial para reconstruir uma relação equilibrada entre ser humano, terra e natureza. Não se trata apenas de corrigir uma injustiça histórica, mas de construir um modelo de desenvolvimento verdadeiramente sustentável, no qual a terra cumpra sua função social, econômica e ecológica.
Em conclusão, se integrada a políticas de agroecologia, bioeconomia e soberania alimentar, a reforma agrária pode ser o motor de uma transição ecológica justa – com inclusão social, equilíbrio climático e proteção da biodiversidade.
Sugestões de melhoria para a reforma agrária estrutural
- Atualização dos dados do INCRA e IBGE em tempo real para acompanhamento da distribuição fundiária.
- Ampliação de políticas públicas de crédito e assistência técnica ecológica para assentamentos.
- Educação ambiental e agroecológica nas escolas do campo.
- Criação de zonas de regeneração ambiental dentro dos assentamentos.
- Incentivo à certificação participativa e feiras agroecológicas locais.
Resumo com Perguntas e Respostas
É um processo de redistribuição de terras com o objetivo de corrigir desigualdades sociais e econômicas históricas no campo.
A reforma agrária estrutural ou clássica foca na redistribuição fundiária; a agroecológica incorpora práticas sustentáveis de produção, bem como de regeneração ambiental.
Não necessariamente. Pode coexistir com ele, desde que haja limites à concentração fundiária e respeito à função social da terra.
Porque ameaça interesses de elites rurais, que historicamente controlam a terra e o poder político no Brasil.
Sim. Uma vez que, ao promover agroecologia e recuperação de áreas degradadas, reduz emissões e aumenta a resiliência dos territórios.