Justiça Energética: quando a energia acende direitos, não apenas lâmpadas
“Luz que não chega a todos é sombra de privilégio. Energia sem justiça é silêncio no escuro da exclusão.” — “A justiça energética é central para a transição ecológica. Ou seja, não podemos reproduzir desigualdades com painéis solares ou turbinas eólicas.” — Jacqueline Patterson, fundadora da Chisholm Legacy Project (EUA)
O que é justiça energética?
A justiça energética é uma abordagem que reconhece que energia não é apenas um recurso técnico ou econômico, mas também um direito social e um fator determinante de equidade, dignidade e sustentabilidade.
Ela propõe que todas as pessoas — independentemente de sua renda, localização ou origem — tenham, por exemplo:
- Acesso seguro, regular e acessível à energia limpa
- Participação nas decisões sobre o modelo energético
- Proteção contra impactos ambientais e sociais causados por projetos energéticos
- Controle social sobre a geração, bem como a distribuição de energia.
Trata-se de garantir transparência, equidade, reparação histórica e inclusão nos processos que moldam as políticas e estruturas energéticas de um país ou território.
Justiça energética x injustiça energética: qual a diferença?
Justiça Energética | Injustiça Energética |
---|---|
Participação social real nas decisões | Decisões centralizadas e excludentes |
Tarifas acessíveis para todos | Energia cara e inacessível para populações vulneráveis |
Respeito a territórios e ecossistemas | Megaprojetos que removem comunidades e destroem biomas |
Geração descentralizada e comunitária | Monopólio de grandes empresas energéticas |
Reconhecimento dos povos tradicionais | Invisibilidade e violações de direitos |
Importância da justiça energética
A chamada transição energética — a substituição dos combustíveis fósseis por fontes renováveis de energia — não é automaticamente justa.
Muitos projetos de energia limpa são:
- Concentrados em poucas mãos
- Impostos sem consulta às comunidades
- Marcados por remoções, conflitos e exploração de territórios indígenas e rurais
Por exemplo: parques eólicos no Nordeste e usinas solares no semiárido têm causado conflitos fundiários, racismo ambiental e exclusão social — mesmo sendo “limpos” do ponto de vista técnico.
A justiça energética exige que a transição seja socialmente justa, ecológica, e, assim, democrática.
Exemplos práticos de justiça energética no Brasil e no mundo
No Brasil
- Cooperativas de energia solar no sertão da Bahia e Ceará, com protagonismo de mulheres, assim como da juventude rural.
- Sistemas de geração comunitária em quilombos e aldeias indígenas, com capacitação técnica local.
- Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB): atua por direitos e, principalmente, reparações às vítimas de megaprojetos.
- Tarifa Social de Energia Elétrica, que ainda precisa ser expandida e respeitada.
Internacional
- Justiça energética urbana em Detroit (EUA): ações para garantir acesso à energia em bairros racializados.
- Políticas de energia indígena no Canadá, com autogestão em comunidades remotas.
- Projetos de energia descentralizada na Índia rural, com microgrids solares comunitários
Desafios da justiça energética hoje
- Desigualdade no acesso: 1,6 milhão de brasileiros ainda vivem sem acesso estável à energia (de acordo com o IBGE, 2023)
- Concentração do setor energético nas mãos de empresas privadas ou estatais sem controle popular.
- Modelos tecnocráticos de planejamento energético, sem escuta das populações afetadas.
- Violência contra lideranças que resistem a projetos energéticos (hidrelétricas, eólicas, bem como linhas de transmissão).
- Falta de dados e transparência sobre impactos socioambientais.
O que propõe a justiça energética?
1. Democracia energética
Criação de conselhos populares de energia, consulta prévia e livre para projetos e marcos legais que garantam então o controle social sobre decisões estratégicas.
2. Energia como direito universal
Garantia de tarifas justas, redes estáveis e combate aos “desligamentos por inadimplência” nas populações vulneráveis.
3. Geração descentralizada
Incentivo a microgeração, redes locais, cooperativas de energia e autonomia energética comunitária.
4. Reparação a populações atingidas
Reconhecimento dos direitos de comunidades deslocadas por barragens e parques energéticos, com indenização justa e reintegração territorial.
5. Integração com outras agendas
Justiça energética não pode ser isolada: deve dialogar com reforma agrária, soberania alimentar, justiça climática e descarbonização da economia.
Em resumo
Justiça energética é o alicerce de uma transição ecológica que respeita pessoas, territórios e culturas. Em conclusão, não basta substituir fontes fósseis por painéis solares: é preciso mudar as estruturas de poder, garantir equidade e promover participação popular.
No Brasil — país com matriz energética majoritariamente renovável, mas ainda injusta — essa justiça é urgente e possível.
Como bem resume o Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB: “Energia não é mercadoria. Energia é vida.”
Perguntas e respostas para reflexão crítica
Não. Porque se for imposta sem consulta, causar remoções ou explorar territórios, mesmo a energia limpa pode reproduzir injustiças.
Depende. Porque sem controle social, a privatização tende a aumentar tarifas e excluir os mais pobres.
Não. Afinal, existem experiências reais, funcionando em várias partes do mundo — o desafio é ampliá-las com políticas públicas.
Sim. Uma vez que, com redes descentralizadas, produção local e gestão democrática, cidades e comunidades podem controlar sua matriz energética.
Deve ser. Pois, tratar energia como bem comum é condição para garantir dignidade, saúde e sustentabilidade.